sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

China divulga livro branco sobre desenvolvimento pacífico


O governo chinês publicou na terça-feira um livro branco sobre o desenvolvimento nacional, destacando que o desenvolvimento pacífico é escolha estratégica da China para realizar a modernização, tornar-se forte e próspera e fazer maior contribuição ao progresso da civilização humana.
 
O livro branco, divulgado pelo Departamento de Comunicação do Conselho de Estado, gabinete chinês, apresenta o caminho, o objetivo e a política externa do desenvolvimento pacífico e explica o que o desenvolvimento pacífico da China significa para o resto do mundo.
 
A China declarou ao mundo em muitas ocasiões que segue um caminho de desenvolvimento pacífico e está comprometida a apoiar a paz mundial e promover o desenvolvimento e prosperidade comuns para todos os países, diz o livro branco.
 
Como membro da comunidade internacional, a China tem grande esperança no mundo futuro e adota um conceito de relações internacionais e política externa correspondente ao desenvolvimento pacífico, diz.
 
O desenvolvimento pacífico é uma escolha estratégica feita pelo governo e povo chineses em conformidade com a boa tradição da cultura chinesa, a tendência de desenvolvimento da atualidade e os interesses fundamentais da China, e ele também é uma escolha exigida pelo desenvolvimento da China, segundo o livro branco.
 
O caminho de desenvolvimento pacífico é um novo caminho de desenvolvimento que a China, o maior país em desenvolvimento no mundo, iniciou, e seu impacto global se manifestará com o passar do tempo, indica o livro branco.
 
A China espera que a comunidade internacional tenha confiança na sinceridade e na determinação do povo chinês para alcançar o desenvolvimento pacífico, e apoie, em lugar de impedir, a busca da China pelo desenvolvimento pacífico, diz o livro branco.
Texto completo(em inglês)

EUA, Israel ou Rússia, Quem está por trás do Stuxnet?




Depois de inicialmente Symantec fez um pouco de engenharia reversa sobre o worm Stuxnet agora infame, muitos começaram a apontar o dedo para os EUA e Israel, especialmente desde que concluiu-se que o pedaço de malware foi projetado para uma versão específica do SCADA Siemens controles lógicos programáveis (PLC) que operam em determinadas instalações nucleares do Irã. Ralph Langner disse em uma conferência na Califórnia, que o software malicioso foi projetado para sistemas de aleijado que poderiam ajudar a construir um iraniano bomb.Mr Langner foi um dos primeiros pesquisadores a mostrar como Stuxnet poderá assumir o controle de equipamentos industriais.

Dr. Panayotis A. Yannakogeorgos é um analista de defesa cibernética com a Força Aérea dos EUA Research Institute. Ele disse ao diplomata que o único ponto fraco da teoria de que os EUA e Israel atingiu o problema nuclear iraniano com Stuxnet é que ambos os lados negou quando eles não teriam que. Yannakogeorgos disse que os russos poderiam ter igualmente realizado o ataque. Apparenly os russos não são tão felizes com uma capacidade indígenas nuclear iraniano, mesmo se eles estão ajudando a construí-la.


Em resumo, o caso para os Estados Unidos ter projetado e desenvolvido Stuxnet é a seguinte: Em primeiro lugar, nem os Estados Unidos nem Israel quer que o Irã desenvolva armas nucleares. O worm, então, é visto como parte provavelmente de uma estratégia secreta para atrasar ou destruir infra-estrutura nuclear do Irã e parar com a guerra. A arma foi projetado para uma versão específica do SCADA Siemens controles lógicos programáveis ​​(PLC) que opera uma configuração específica e número de centrífugas em cascata encontrados em Iran. Alguns analistas apontam para o fato de que houve avaliações de vulnerabilidade que está sendo executado no Idaho National Labs em software Siemens PLC. Outros notam que o design da arma do cyber perto encaixam na descrição de Richard Clark, em guerra cibernética de um bem concebido e eticamente pensado arma limitando os danos colaterais devido a um vasto exército de advogados analisando os efeitos. A comunidade de malware analista, entretanto, aponta para seqüências de código digital, tais como "b: \ Myrtus \" tiradas de eventos bíblicos importantes para a identidade israelense. E, como diz a história, depois das decisões políticas, as avaliações de vulnerabilidade e design arma ocorreu, seja um agente iraniano foi encontrado para tirar o memory stick USB para a instalação nuclear, ou todos os computadores ao redor das plantas foram infectadas com o Stuxnet via o worm conficker.


A Rússia tem uma boa razão para não querem que o Irã de obter suas patas em tecnologia nuclear. Em 1995, por exemplo, os rebeldes chechenos plantou uma "bomba suja" em Moscou Izmailovsky Park.Material nuclear é muito mais seguro na Rússia, mas se o Irã desenvolve uma capacidade full-blown nuclear, chechenos ou outros extremistas violentos e os rebeldes nacionalistas ir ao Irã para comprar o material.


O ataque Stuxnet pode ser acoplado com uma campanha de assassinato visando cientistas nucleares iranianos e computador e vários vazamentos sugerindo ações secretas, todos feitos para um caso convincente do envolvimento dos EUA. Mas se era os Estados Unidos ou a Rússia por trás dele, é claro que no rescaldo do Stuxnet, e com o surgimento de outros vermes dentro de seus sistemas, engenheiros nucleares iranianos têm menos confiança na precisão de informações do sensor em telas digitais. Tudo isso significa que agora não há necessidade de os EUA ou a Rússia para dizer qualquer coisa sobre o conflito questão interna nas mentes dos responsáveis ​​pelo programa nuclear do Irã está fazendo um trabalho perfeito estado de retardar o progresso.
Fonte: THN

domingo, 25 de dezembro de 2011

A rotação pacífica de Obama

Por Joseph Nye



O retorno da Ásia ao centro das questões mundiais é a grande deslocação de poder do século XXI. Em 1750, a Ásia tinha cerca de três quintos da população mundial e respondia por três quintos da produção global. Em 1900, depois da Revolução Industrial na Europa e na América, a parte Asiática na produção global tinha encolhido para um quinto. Em 2050, a Ásia terá certamente voltado à posição que ocupava 300 anos antes.
Mas, em vez de se manterem alerta a essa situação, os Estados Unidos desperdiçaram a primeira década deste século atolados em guerras no Iraque e no Afeganistão. Agora, como a secretária de Estado dos EUA, Hillary Clinton, referiu num discurso recente, a política externa norte-americana “rodará” para a Ásia Oriental.

A decisão do Presidente Barack Obama de destacar 2500 fuzileiros para uma base na Austrália setentrional é um sinal precoce dessa rotação. Adicionalmente, a reunião em Novembro da Cooperação Económica Ásia-Pacífico, realizada no Havai, estado natal de Obama, promoveu um novo conjunto de rondas comerciais denominado Parceria Trans-Pacífica. Ambos os eventos reforçam a mensagem de Obama para a região Ásia-Pacífico de que os EUA tencionam permanecer uma potência comprometida.

A rotação para a Ásia não significa que outras partes do mundo já não sejam importantes; pelo contrário, a Europa, por exemplo, tem uma economia muito maior e mais rica que a China. Mas, como o conselheiro nacional para a segurança de Obama, Tom Donilon, explicou recentemente, a política externa dos EUA nos últimos anos tem sido condicionada pelas guerras no Iraque e no Afeganistão, por preocupações sobre o terrorismo, por ameaças de proliferação nuclear no Irão e na Coreia do Norte, e pelas recentes revoltas árabes. A viagem de Obama em Novembro à Ásia foi um esforço para alinhar as prioridades de política externa dos EUA com a importância que a região terá no longo prazo.

Nas palavras de Donilon, “elevando esta dinâmica região a uma das nossas prioridades estratégicas principais, Obama está a demonstrar a sua determinação de não deixar o nosso navio de estado ser desviado do seu curso por crises rotineiras”. A administração Obama anunciou também: “vamos garantir que protegeremos as capacidades que necessitamos para manter a nossa presença na [região] Ásia-Pacífico”. Qualquer que seja o resultado dos debates sobre o orçamento da defesa.

A viagem de Obama em Novembro foi também uma mensagem para a China. Depois da crise financeira de 2008, muitos chineses exprimiram a crença errónea de que os EUA estavam em declínio terminal e que a China deveria ser mais assertiva – particularmente na perseguição das suas exigências marítimas no sul do Mar da China – às custas dos aliados e dos amigos da América. Durante o primeiro ano da presidência de Obama, a sua administração colocou uma alta prioridade na cooperação com a China, mas os líderes chineses pareceram interpretar erradamente a política dos EUA como um sinal de fraqueza.

A administração tomou uma atitude mais forte quando Clinton abordou a questão do sul do Mar da China na reunião das Associação das Nações do Sudoeste Asiático em Hanói em Julho de 2010. A subsequente visita oficial do Presidente Chinês Hu Jintao a Washington em Janeiro de 2011 foi bem-sucedida, mas muitos editorialistas chineses queixaram-se de que os EUA estavam a tentar “conter” a China e impedir a sua ascensão pacífica.

Os receios da China sobre uma suposta política de contenção por parte dos EUA estão novamente a subir, agora que Clinton insiste que as disputas marítimas do país com os seus vizinhos façam parte da agenda na Cimeira da Ásia Oriental do próximo ano em Manila, em que estarão presentes Obama, Hu Jintao e outros líderes regionais.

Mas a política norte-americana relativamente à China é diferente da contenção feita na Guerra Fria ao bloco soviético. Enquanto os EUA e a União Soviética tinham comércio e contacto social limitados, os EUA são o maior mercado ultramarino da China, apoiaram e facilitaram a entrada da China na Organização Internacional do Comércio e abrem os portões das suas universidades a 125 mil estudantes chineses todos os anos. Se a política actual dos EUA relativamente à China é, supostamente, de contenção como na Guerra Fria, parece insolitamente calorosa.

East Asia Strategy Review do Pentágono, que guia a política norte-americana desde 1995, ofereceu à China integração no sistema internacional através do comércio e de programas de intercâmbio. Embora os EUA tenham protegido a sua aposta fortalecendo simultaneamente a sua aliança com o Japão, isto não significa contenção. Afinal, os líderes da China não podem prever as intenções dos seus sucessores. Os EUA estão a apostar que serão pacíficos, mas ninguém sabe. Uma protecção exprime cautela e não agressão.As forças militares norte-americanas não aspiram a “conter” a China à maneira da Guerra Fria, mas podem ajudam a moldar o ambiente em que os futuros líderes chineses farão as suas escolhas. Repito o meu testemunho perante o Congresso dos EUA de 1995 em resposta àqueles que, mesmo então, preferiam uma política de contenção em vez do compromisso: “Só a China pode conter a China.”

Se a China se tornar num brutamontes na região Ásia-Pacífico, outros países se juntarão aos EUA para a confrontar. Na verdade, foi por isso que muitos dos vizinhos da China fortaleceram os seus laços com os EUA desde 2008, quando a política externa chinesa se tornou mais assertiva. Mas a última coisa que os EUA querem é uma II Guerra Fria na Ásia.

Independentemente das posições competitivas dos dois lados, a cooperação sino-americana beneficiará ambos os países em assuntos como o comércio, a estabilidade financeira, a segurança energética, a mudança climática e as pandemias. O resto da região colherá daí frutos, também. A rotação da administração Obama para a Ásia assinala o reconhecimento do grande potencial da região, não um apelo vibrante à contenção.

Tradução de António Chagas/Project Syndicate

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Andrade Gutierrez e Thales fecham parceria

Por Francisco Góes | Valor Do Rio

 Dois grandes grupos, um brasileiro e outro francês, estão juntando forças para atuar na área de defesa e segurança, um mercado bilionário que exige experiência em gestão de grandes projetos e capacitação tecnológica. A parceria é formada pela Andrade Gutierrez, construtora que diversificou investimentos e fatura cerca de R$ 20 bilhões por ano, e pela Thales, que mantém negócios nas áreas de defesa, segurança, aeroespacial e de transportes e que, no ano fiscal de 2010, faturou € 13,1 bilhões. Os dois grupos decidiram criar uma joint venture, ainda sem nome definido, que deverá estar constituída no primeiro trimestre de 2012. Os acionistas serão a Andrade Gutierrez Defesa e Segurança, com 60%, e o grupo Thales, com 40%. A nova empresa, com sede no Rio, terá foco de atuação em áreas como segurança urbana e vigilância e monitoramento de fronteiras. O acordo soma a experiência da Andrade na gestão de grandes projetos e a capacitação tecnológica da Thales nessas áreas a partir do uso ferramentas como radares, câmaras de visão noturna, redes de comunicação e equipamentos de vigilância. Giovanni Foragi, presidente da Andrade Gutierrez Defesa e Segurança, disse que a escolha da Thales para formar a parceria se relaciona com a disposição do grupo francês de transferir tecnologia para criar uma indústria nacional com competência tecnológica. A Thales, que tem participação de 27% do governo francês e de 25,9% da Dassault Aviation, tem uma série de soluções e produtos voltados para as áreas de segurança e defesa. A Andrade Defesa e Segurança foi criada em 2011 como subsidiária do grupo brasileiro. Foragi afirmou que a joint venture está alinhada com o conceito da Empresa Estratégica de Defesa (EED), prevista na medida provisória 544, de setembro, que estabelece normas especiais para as compras, contratações de produtos, de sistemas e do desenvolvimento de produtos e sistemas de defesa. A parceria entre Andrade e Thales precisará passar por qualificação do Ministério da Defesa para constituir-se como EED. Um dos focos potenciais de negócios da joint venture é o Sistema de Monitoramento de Fronteiras (Sisfron), do Exército, com custo de implantação estimado em R$ 10 bilhões. O primeiro alvo da joint venture é disputar o projeto-piloto do Sisfron, disse Foragi. O executivo afirmou, porém, que todos os projetos do Exército, da Marinha e da Aeronáutica que demandem soluções e sistemas estarão no escopo da parceria com a Thales. A sociedade também poderá fazer aquisições de empresas que atuem, por exemplo, na área de análise de imagens (visão noturna) ou outros segmentos. "A joint venture poderá adquirir uma tecnologia existente e aprimorá-la", disse Foragi. Laurent Mourre, diretor-geral da Thales no Brasil, disse que a transferência de tecnologia passa por processo de autorização do governo francês. Mas reconheceu que hoje é mais fácil transferir tecnologia para o Brasil em função da parceria estratégica acertada pelos dois países em dezembro de 2008. Um dos pontos do plano é a cooperação na área de defesa. Laurent disse que os princípios gerais da joint venture foram fixados. A sociedade não informa previsões sobre receita. Mourre disse que há expectativa de capacitar fornecedores brasileiros e, entre as áreas potenciais de transferência de tecnologia, estão sensores (radares e câmeras), satélites de observação, veículo aéreo não tripulado (Vant) e sistemas de comunicação, entre outros. O anúncio da parceria entre Andrade e Thales coincidiu com a visita ao Brasil, na semana passada, do primeiro-ministro da França, François Fillon. O presidente da Thales International, Blaise Jaeger, disse que a parceria estratégica entre os dois países é importante para a empresa e permitiu a associação com a Andrade na área de defesa e segurança. Ele afirmou que o acordo com a construtora brasileira representa a primeira joint venture estratégica para a Thales no mercado brasileiro, onde o grupo francês controla a Omnisys, empresa com sede em São Bernardo do Campo (SP).

Fonte: Valor

domingo, 11 de dezembro de 2011

O Brasil e as missões de paz da ONU.


Embora o Brasil tenha participado, com freqüência, das operações de paz constituídas sob mandato das Nações Unidas, nota-se que a política externa brasileira apresenta restrições e reservas no que concerne à amplitude e à índole das ações militares em território estrangeiro.
1. As operações de paz: fundamentos jurídicos e características gerais
As operações de paz, fenômeno complexo e de características mutáveis, foram concebidas para ser uma forma legítima do uso da força no âmbito internacional. Como consistem, em tese, na expressão armada da vontade coletiva dos membros das Nações Unidas, as operações são um dos meios juridicamente admissíveis de ação coercitiva. Ainda que, em seus primórdios, elas apresentassem características unicamente defensivas, constituídas por mandatos restritivos e por equipamentos de baixa letalidade, as operações de paz, mesmo as denominadas operações de manutenção da paz, em sentido estrito, são uma forma de uso da força legalmente fundamentada na idéia de segurança coletiva.

Embora tenham sido freqüentes desde a fundação da ONU, as operações não estão expressamente previstas na Carta de São Francisco. Sua legalidade decorre, por conseqüência, de interpretação teleológica, sistemática e extensiva do documento constitutivo da ONU, principalmente daquelas regras referentes à amplitude da competência da Assembléia Geral (Art. 11, 1, da Carta da ONU) e do Conselho de Segurança (Art. 24, 1, da Carta da ONU). Este, especialmente, constitui órgão fundamental na execução de quaisquer medidas coercitivas, inclusive nos casos de uso moderado da força pelos empreendimentos de manutenção e de construção da paz, operações que, na atualidade, são consideradas multidimensionais, uma vez que envolvem, em grande medida, finalidades múltiplas e recursos humanos civis.

Os objetivos, as regras e os princípios da organização seriam letra morta, caso a ação armada, ainda que coletiva, fosse absolutamente vedada. As características principais e os princípios que regem as operações de paz foram construídos, consuetudinariamente, com base nas disposições da Carta, na observância das normas de direito humanitário e na própria prática de formação de contingentes militares multinacionais. A classificação das operações de paz decorreu, por sua vez, da necessidade de distinguir ações militares de intensidade variada, dotadas de poder de destruição modulado conforme as características do caso concreto.

A experiência das primeiras operações de paz (e.g. UNTSO, Oriente Médio, 1948; UNEF I, Sinai/Faixa de Gaza, 1956; ONUCA, Congo, 1960; UNYOM, Iêmen, 1963; UNFICYP, Chipre, 1964; UNIPOM, fronteira entre Índia e Paquistão, 1965) possibilitou a formulação de princípios que deveriam reger as sua ações militares. Esses princípios, segundo Eugênio Diniz, podem ser sistematizados da seguinte forma:

a) condução pelos funcionários da ONU: os efetivos militares pertencem aos Estados, mas eles agem em nome das Nações Unidas, ainda que, em caso de infração à norma de conduta militar, sejam julgados pela jurisdição de seus respectivos países;

b) consentimento das partes envolvidas no conflito: a interferência da ONU deve ser legitimada pelas autoridades locais, sob pena de violação do inciso 7 do Art. 2.º da Carta;

c) imparcialidade em relação às partes em conflito: os contingentes da ONU não atuarão como aliados de nenhuma das partes, ainda que objetivem a minimização das baixas de ambas;

d) uso restrito da força: os militares da ONU só poderão agir em legítima defesa e nos limites do mandato da missão.

A complexidade dos cenários de conflito, a observância dos preceitos da Carta de São Francisco (e.g. promoção dos direitos humanos, art. 1.º da Carta) e os insucessos de algumas operações foram determinantes para que esses princípios fossem reinterpretados. Em determinadas situações, a imparcialidade na zona de combate, por exemplo, poderia significar a conivência em relação a atos violadores de direitos humanos, o que contrariaria preceito basilar da organização. O consentimento das partes, por sua vez, não poderia ser requisito absoluto para ação, uma vez que, em certas situações, a segurança da população civil e o fornecimento de ajuda humanitária mínima não são autorizados pelas lideranças combatentes. Os princípios das operações, por conseqüência, tiveram de ser readaptados às situações mais complexas e violentas, a fim de que a busca por resultados concretos não colocasse em risco os componentes da operação e as populações afetadas pelo conflito.

No que concerne à tentativa de regulamentação jurídica das operações, deve-se citar o relatório Agenda para Paz, apresentado, em 1992, pelo Secretário-Geral da ONU, Bouthros Bouthros-Ghali. Esse documento constitui esforço de sistematização das ações que objetivam a manutenção de paz. Nele são mencionados quatro procedimentos distintos de manutenção da paz: diplomacia preventiva (preventive diplomacy, art. 23 e ss), pacificação (peacemaking, art. 34 e ss) , manutenção da paz (peace-keeping, art. 46 e ss) e construção da paz após o conflito (post-conflict peace-building, art. 55 e ss). O primeiro é baseado no capítulo VI da Carta da ONU (solução pacífica de controvérsias); os outros três, por sua vez, são fundamentados, ainda que implicitamente, nos capítulos VI e VII, uma vez que, dependendo da situação, podem requerer o uso da força que extrapola os limites da atividade meramente defensiva e policial. No relatório, na seção IV, referente à pacificação, mencionam-se as unidades de imposição da paz (peace enforcement units, art. 44 e 45), as quais, no entendimento de Eugênio Diniz, são uma novidade conceitual, uma vez que a constituição desses corpos militares implica grande incremento do poder de fogo da operação, o que, por conseqüência, aumenta o grau de letalidade desta.

No ano de 2000, no mandato de Kofi Annan, o Secretariado das Nações Unidas encomendou relatório acerca da possibilidade de ampla revisão das ações concernentes à paz e à segurança. No relatório Brahimi, resultante da iniciativa de Annan, declarou-se que as características e a amplitude dos mandatos das operações de paz deveriam ser adequadas aos seus objetivos. Em situações nas quais fossem necessários armamentos mais pesados e maior poder de iniciativa para seus componentes, as operações de paz deveriam agir sob a salvaguarda das devidas autorizações legais, as quais seriam fundamentadas no capítulo VII da Carta de São Francisco.

Principalmente após os fatos que ocorreram durante a UNOSOM II (Somália) e a UNAMIR/UNOMUR (Ruanda), nas quais se tornou evidente a desproporção entre os meios materiais dos contigentes militares e as finalidades da operação, a ONU entendeu que era necessária uma revisão realista de seus procedimentos relacionados à segurança internacional ainda que isso desagradasse delegações de países que temiam a ingerência indevida e excessiva da organização em assuntos internos. Como, nos mandatos citados, os membros da operação foram prejudicados por restrições legais e pela baixa ofensividade dos armamentos utilizados, a revisão mencionada no relatório Brahimi objetivava o incremento do potencial ofensivo das operações confome as necessidades do caso concreto. As tropas, por conseguinte, deveriam, segundo novo entendimento, ser dotadas dos meios necessários para autopreservação e para o alcance de seus objetivos. Quanto mais ambiciosos os objetivos, portanto, maiores deveriam ser a amplitude do mandato da operação e o poder bélico das tropas. Se, anteriormente, todas as operações tinham fundamento jurídico em interpretação sistemática, extensiva e teleológica dos dispositivos do capítulo VI e VII (ou, conforme o Secretário-Geral Dag Hammarskjold, no capítulo VI e meio), após o relatório Brahimi, as operações militarmente mais complexas passaram a ser baseadas diretamente no capítulo VII.

A fundamentação no capítulo VII altera, substancialmente, as características das operações de paz, pois, na prática, derroga os princípios referentes ao consentimento das partes e ao uso restrito da força. No inciso 7 do Art. 2.º da Carta da ONU, a regra da não intervenção em assuntos que dependam essencialmente da jurisdição interna é excetuada pela aplicação do capítulo VII:

7. Nenhuma disposição da presente Carta autorizará as Nações Unidas a intervir em assuntos que dependam essencialmente da jurisdição interna de qualquer Estado, ou obrigará os membros a submeterem tais assuntos a uma solução, nos termos da presente Carta; este princípio, porém, não prejudicará a aplicação das medidas coercitivas constantes do capítulo VII. (grifos nossos)

A possibilidade de constituir missões com base no capítulo VII transforma as operações de paz em verdadeiras unidades militares. Em decorrência disso, ocorre relevante ampliação de seu poder no campo de batalha. Em vista do aumento do potencial ofensivo, elas passam a constituir as forças armadas, ainda que temporárias, da Organização das Nações Unidas. Como exemplos de operações cujo mandato é expressamente baseado no capítulo VII, citam-se: UNMIBH (Resolução 1088/1996 do CS, Bósnia Herzegovina), UNMISET (Resolução 1590/2005 do CS, Timor Leste), UNMIS (Resolução 1590/2005, Sudão), MINUSTAH (Resolução, 1608/2005, Haiti).

2. O Brasil nas operações de paz das Nações Unidas
Embora o Brasil tenha participado, com freqüência, das operações de paz constituídas sob mandato das Nações Unidas, nota-se que a política externa brasileira apresenta restrições e reservas no que concerne à amplitude e à índole das ações militares em território estrangeiro. Estas, quando fundamentadas no capítulo VII da Carta da ONU, não são, em regra, plenamente endossadas pelo Brasil, conforme verificado, em momento recente, no caso da Resolução 1973/2011, proferida no decorrer da insurreição popular na Líbia. Essa norma, apesar de conter expressa condenação do governo líbio pela afronta aos direitos humanos e por crimes contra a humanidade, aspectos de extrema gravidade, possibilita, no entendimento da diplomacia brasileira, o uso excessivamente amplo de meios armados, o que caracteriza intervenção ilegítima nos assuntos internos do Estado africano, além de contrariar o princípio da solução pacífica dos conflitos, contido na Carta da ONU (capítulo VI) e reproduzido na Constituição Federal de 1988 (inciso VII do art. 4.º).

A posição brasileira deve ser analisada com base na tradição diplomática do país e nos incisos do art. 4.º da Constituição Federal, dispositivo que contém os princípios regentes das relações internacionais do Brasil. Na história da política externa brasileira, os conflitos, por mais graves que sejam, são, preferencialmente, solucionados por meios pacíficos, conforme é evidente no estudo do processo de fixação de limites com os países vizinhos, tarefa que costuma ser bastante conflituosa em outras regiões do mundo (LAFER, 2004). Os princípios III, IV e VII, que são, respectivamente, autodeterminação dos povos, não intervenção e solução pacífica dos conflitos, são, por sua vez, limitadores das ações militares externas do país, mesmo se estas forem executadas sob mandato de organização internacional. A prática da guerra de conquista, a intervenção nos assuntos internos de outra soberania e a aplicação de medidas coercitivas como forma de solucionar divergências não são, portanto, admissíveis segundo o ordenamento jurídico nacional.

As operações baseadas no capítulo VII da Carta da ONU são, em regra, caracterizadas por maior grau de letalidade e por mais amplo poder de intervenção. Elas são compostas, conforme nomenclatura do relatório Agenda para a paz, por unidades de imposição da paz (peace enforcement units), o que pode descaracterizar a neutralidade da ação. Em que medida essas ações são coerentes com a tradição diplomática brasileira e com os princípios da Constituição de 1988 são questões ainda não respondidas de maneira satisfatória.

Para o Brasil, participar de uma operação de paz, principalmente se fundamentada no capítulo VII, significa participar de uma coalizão de guerra, embora o confronto bélico, em sua forma convencional, seja inconciliável com os preceitos vigentes no direito das gentes e com os princípios do Estado brasileiro. A participação brasileira nas operações de paz, além disso, implica, necessariamente, a mobilização de militares nacionais e o dispêndio, em território estrangeiro, de recursos econômicos escassos do país, uma vez que, em um primeiro momento, a missão deve ser custeada pelos Estados que a compõem. Os resultados da operação, por sua vez, não beneficiam, diretamente, o povo brasileiro, ainda que seu êxito favoreça toda a coletividade de Estados. Compreender em que medida o Estado deve participar das operações de paz é conhecimento de interesse geral da população brasileira, aspecto que reforça a necessidade de tratamento público e transparente do tema.

O direito internacional público restringe o uso da força a situações excepcionais. As operações de paz são uma forma lícita de uso da força, uma vez que, em tese, decorrem da vontade coletiva dos Estados em favor da manutenção da paz no âmbito internacional. O Brasil, país que, tradicionalmente, desenvolve política externa pacífica e legalista, tem participado, ao longo dos anos, de operações de paz constituídas pela Organização das Nações Unidas e por outras organizações internacionais (e.g. Organização dos Estados Americanos). Das sessenta e três operações constituídas desde a criação da ONU, o Brasil participou de mais de trinta, ainda que, muitas vezes, sua contribuição tenha sido apenas simbólica. A participação brasileira de maior relevância tem ocorrido no Haiti, como líder das forças da MINUSTAH, Operação das Nações Unidas para Estabilização do Haiti, constituída no ano de 2004.

A despeito de sua importância na agenda externa brasileira, há, no âmbito interno, grande desconhecimento acerca das operações de paz, deficiência que impossibilita o julgamento adequado do tema, inclusive sob o prisma jurídico. A população nacional e, com freqüência, os meios de comunicação e a comunidade acadêmica ignoram a relevância e a complexidade dessas ações militares multinacionais, as quais constituem manifestação do princípio da segurança coletiva e forma legalmente admissível de ação armada em benefício da sociedade internacional.

As operações de paz são, com freqüência exagerada, avaliadas apenas sob a perspectiva política, como se apenas expressassem a vontade e o interesse das grandes potências. Embora essa perspectiva, decorrente do realismo político hobbesiano, não seja carente de fundamento, como se verifica da análise do oligárquico processo de decisório do Conselho de Segurança da ONU, a concepção das operações de paz não pode ser avaliada apenas com base no jogo de poder.

As relações internacionais, no entendimento de Celso Lafer, podem ser analisadas em três dimensões distintas: dimensão das relações econômicas, dimensão dos valores e dimensão estratégico-militar. Em cada da uma delas, predomina uma perspectiva distinta das relações internacionais. Nas relações econômicas, por causa das necessidades convergentes de trocas comerciais e de investimentos recíprocos, predomina a visão grociana de cooperação e de colaboração entre os Estados. Na dimensão dos valores, a busca por ideais a serem concretizados (e.g. plena garantia dos direitos humanos, desenvolvimento econômico sustentável), predomina a perspectiva liberal e utópica decorrente do Projeto da Paz Perpétua, de Immanuel Kant. Na dimensão estratégico-militar, por fim, na qual são tratados os assuntos de paz e de guerra, predomina a perspectiva hobbesiana das relações internacionais. Como os assuntos, nessa dimensão, estão relacionados a situações limite, que envolvem a própria sobrevivência do Estado, na forma de coletividade soberana, predomina o realismo egoísta, impulsionado pela esperança de ganhos relativos na sociedade internacional. (LAFER, 2004, p. 184)

O realismo hobbesiano não é, no entanto, a única maneira de analisar a dimensão estratégico-militar, ainda que seja, de fato, a mais eficiente. A própria idéia de entidade internacional, como a ONU e a Sociedade das Nações, que, com base no direito, organiza as relações entre Estados e que garante a paz entre os povos é, em sua origem wilsoniana, projeto utópico e liberal. No cerne da ideia das operações, por sua vez, existem aspectos idealistas, necessários na busca da plena vigência do estado de direito, originários da perspectiva kantiana das relações internacionais, na qual o litígio interestatal seria solucionado por instância de poder superior aos Estados nacionais. A base jurídica das operações de paz, por sua vez, apesar de ser fenômeno cujas especificidades foram construídas consuetudinariamente, decorre da consolidação, ainda que precária, de um ordenamento jurídico internacional, dependente do tipo de cooperação explicitada por Grócio, porém dotado de órgão executivo eficaz (Conselho de Segurança da ONU), mesmo que discriminatório e intergovernamental.

3. Considerações finais
A ampliação da importância internacional do Brasil e o ativismo do país em favor da reforma da Carta da ONU indiciam que os temas relacionados à dimensão estratégico-militar adquirem relevância cada vez maior para os formuladores de políticas públicas. Compreender, nas perspectivas política e jurídica, o funcionamento das operações de paz (compromissos internacionais consolidados na agenda diplomática nacional), sem reduzir o problema ao jogo de poder das relações internacionais, é fundamental para ajustar as necessidades internas às possibilidades externas (LAFER, 2004). O recurso mais freqüente ao capítulo VII da Carta é aspecto que torna essa compreensão ainda mais complexa sob a perspectiva brasileira, uma vez que participar das missões coercitivas de paz (peace enforcement operations) implica contribuir para composição de verdadeira aliança de guerra, cujo grau de letalidade e de intervenção pode não ser adequado às posições tradicionais do país, inclusive no que concerne à irredutível defesa da estrita legalidade internacional.

A política externa, na qualidade de política pública, deve objetivar a realização dos interesses nacionais. Deve, por conseqüência, em um país democrático, haver liame evidente entre a participação nas operações da ONU – conduta de Estado, determinada pela vontade conjugada do Executivo (art. 84, VII e XIII, da CF) e do Legislativo (art. 49, I, da CF), que onera a população nacional – e as demandas e princípios inerentes ao povo brasileiro. Por meio deste artigo interdisciplinar, com ênfase no direito internacional público, o autor buscou destacar essa relação – que, muitas vezes, é implícita – entre as ações militares externas do país e o interesse nacional, o qual, em parte, se vislumbra nas normas constitucionais, especialmente aquelas de conteúdo programático e principiológico.

A despeito das deficiências, das incompletudes e das desigualdades patentes do ordenamento internacional, este é constituído por um conjunto de normas que prescrevem as condutas lícitas e ilícitas dos Estados. As operações de paz, ainda que sejam, em diversos aspectos, problemáticas e ineficazes, são, como explicado supra, a materialização da vontade coletiva dos Estados. O Brasil, como membro originário das Nações Unidas, deve apresentar conduta compatível com os preceitos da Carta, inclusive no que concerne à manutenção da segurança internacional e às operações de paz como forma legítima de garantia desta. De que forma a participação nas operações de paz pode consolidar o comprometimento do Estado brasileiro com a ordem instituída em São Francisco é questão ainda não respondida.

Ao longo da história das relações internacionais, é comum que os países que adquirem maior importância no âmbito internacional sejam demandados, ainda que de forma indireta, a participar mais ativamente de assuntos vinculados à paz e à guerra. Esse processo ocorreu com os Estados Unidos e com o Japão, no final do século 19, e com a China, em período recente. Os Estados Unidos, por exemplo, após assumirem condição de grande potência econômica, mesmo diante de posicionamentos isolacionistas da opinião publica interna, foi impelido a adotar função cada vez mais efetiva na organização da sociedade internacional, especialmente nos temas relacionados à economia e à segurança internacional. Após a Primeira Guerra Mundial, o retorno dos EUA ao isolamento criava, internacionalmente, uma situação insustentável, conforme pode ser inferido da análise dos fatos do período entreguerras.

Embora em proporções diversas, processo semelhante ocorre com os grandes países emergentes (e.g. Brasil e Índia), os quais são cada vez mais necessários no debate dos grandes temas globais, materializados em foros de concertação política como, por exemplo, o G20 financeiro, direcionado aos problemas do sistema monetário internacional, e o BASIC (Brasil, África do Sul, Índia e China), dedicado ao diálogo de quatro grandes países emergentes acerca do meio ambiente. O Brasil, por causa de seu potencial econômico, de sua tradicional participação construtiva na solução de litígios internacionais e de sua crescente relevância para o equacionamento dos denominados temas globais, deve adquirir, em futuro próximo, papel mais importante nas questões relacionadas à segurança. A busca pela reforma da Carta das Nações Unidas, processo no qual estaria incluída a ampliação do Conselho de Segurança, acarreta a necessidade de compreensão apropriada dos mecanismos de ação militar multilateral e de preservação da segurança coletiva. A posição legalista e pacifista do Brasil deve ser coerente com a necessidade de executar, em casos específicos, medidas de força que garantam a preservação da paz e da segurança da sociedade de Estados.

Em decorrência desse novo papel desempenhado pelo Brasil no âmbito internacional, bem como por causa da tradição do país em operações de paz, o estudo do tema é fundamental para subsidiar, para contestar ou para revisar, em termos teóricos e práticos, as posições que serão adotadas pelo governo em nome do povo brasileiro. Este, por sua vez, embora, historicamente, se interesse mais por assuntos de natureza doméstica, será, progressivamente, mais incitado a opinar acerca da política externa do país, inclusive no que concerne a operações paz e a intervenções armadas em locais distantes do mundo. Seriam estas missões um ônus desmesurado e evitável imposto ao povo brasileiro ou o simples cumprimento de uma inescapável obrigação internacional? As respostas a essa questão, para que sejam construtivas e consistentes, devem ser baseadas no conhecimento amplo dos interesses domésticos e da realidade normativa e política do ambiente internacional. A pretensão do autor, por meio deste despretensioso artigo, foi a de contribuir, ainda que modestamente, na construção coletiva desse conhecimento acerca da relação entre o interno (o Brasil) e o externo (sociedade internacional), vínculo instigante que determina as próprias características da identidade nacional.

4. Bibliografia

AMARAL JR, Alberto do. Introdução ao Direito Internacional Público. São Paulo: Atlas, 2008.

DINIZ, Eugênio. O Brasil e as operações de paz. In. ALTEMANI, Henrique & LESSA, Antônio Carlos (org.).Relações Internacionais do Brasil: temas e agendas. V.2. São Paulo: Saraiva/IBRI, 2006.

LAFER, Celso. Comércio, desarmamento e direitos humanos: reflexões sobre uma experiência diplomática. São Paulo: Paz e Terra, 2006.

—————— A identidade internacional do Brasil e a política externa brasileira: passado, presente e futuro. São Paulo, Editora Perspectiva, 2004.

SEITENFUS, Ricardo. Manual das Organizações Internacionais. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2000.

5. Documentos

Pacto da Sociedade das Nações

(disponível em http://www.dhnet.org.br/direitos/anthist/his1919.htm)

Tratado de Renúncia à guerra (Pacto Kellog-Briand ou Pacto de Paris)

(http://www2.mre.gov.br/dai/renguerra.htm)

Carta da Organização das Nações Unidas

(disponível em http://www.un.org/en/documents/charter/)

Constituição Federal de 1988

(disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm)

Relatório Agenda para a Paz

(disponível em http://www.un.org/Docs/SG/agpeace.html)

Relatório Brahimi

(disponível em http://www.un.org/peace/reports/peace_operations/)

Resoluções do Conselho de Segurança

(disponível em http://www.un.org/documents/scres.htm)

Fonte: R7 e http://parceirospelapaz.wordpress.com

domingo, 4 de dezembro de 2011

Henry Kissinger disseca estratégias diplomáticas da China


Sobre a China, de Henry Kissinger. Tradução de Cassio de Arantes Leite. Editora Objetiva, 576 pgs. R$ 54,90

Por Williams Gonçalves

Com despretensioso título que revela a peculiar falsa modéstia do autor, “Sobre a China”, o último livro de Henry Kissinger, poderá ser agora lido em português. Os leitores brasileiros interessados em conhecer mais o país que avança aceleradamente para se tornar a principal potência mundial e os que se interessam também pelas negociações diplomáticas que aproximaram esse país dos Estados Unidos terão a imperdível oportunidade de satisfazer sua curiosidade nesse surpreendente livro de difícil classificação. Misto de História, de memórias, de reflexão estratégica e de análise política, “Sobre a China” traz revelações muito importantes para a compreensão da política mundial contemporânea.

Obras inspiraram aproximação de EUA e China

Dois livros foram fundamentais na carreira acadêmica e política do talentoso professor de Harvard: “Um mundo restaurado: Metternich, Castlereagh e os problemas da paz — 1812-1822” e “Armas nucleares e política externa”, ambos publicados em 1957. No primeiro, Kissinger defende que, em um sistema internacional multipolar, a paz somente pode ser alcançada mediante o equilíbrio de poder; no segundo, ele sustenta que a doutrina estratégica de defesa havia de se adaptar à existência dos arsenais nucleares.

Teria sido a leitura desses livros que levou o presidente dos Estados Unidos Richard $a convidá-lo a ocupar a função de Conselheiro para Segurança Nacional. Conselheiro até 1972, Kissinger converteu-se em Secretário de Estado em 1973, ocupando esse posto até 1976, nele permanecendo mesmo após a renúncia do presidente em 1974, sob ameaça de impeachment.

Esses dois livros contêm as ideias básicas que inspiraram a audaciosa reviravolta estratégica promovida por Nixon de iniciar um diálogo diplomático com a China em 1969, depois de 20 anos de silêncio profundo. Kissinger, humildemente, atribui ao presidente a excep$sagacidade de perceber que a aproximação à China constituía a chave que abriria a porta para a saída dos Estados Unidos do atoleiro em que estavam metidos no Vietnã. Seu mérito teria sido apenas o de negociar com os chineses, mantendo-se sempre fiel à concepção estratégica de Nixon.

O êxito da grande manobra teria sido fruto da coincidência do plano de Nixon com as ideias alimentadas pelos estrategistas chineses de sair do isolamento em que a Revolução Cultural havia colocado a China e, ao mesmo tempo, de enfrentar a ameaça de um $ataque soviético. Tanto norte-americanos como chineses, orientados pela lógica da realpolitik, segundo a qual as razões de Estado situam-se acima das diferenças ideológicas, davam-se conta de que, para a realização de seus respectivos objetivos nacionais, convinha deixar de lado as divergências e se concentrar nos pontos comuns e fundamentais de entendimento.

A capacidade de saber discernir com clareza a contradição principal e o aspecto principal da contradição é, para Kissinger, atributo reservado a poucos. Pertence, por assim $, a inteligências especiais, situadas em patamar elevado. As da planície permanecem enredadas em debates sem fim sobre coisas como a súbita transformação do inimigo comunista em aliado ou com incidentes como o da Praça da Paz Celestial. Homens excepcionais como Metternich, Castlereagh, Nixon, Kissinger, Mao Tsé-Tung e Zhou Enlai têm o talento para promover uma mudança radical na geopolítica mundial e inaugurar uma nova ordem internacional.

Mao Tsé-Tung torcia pela eleição do direitista Nixon

A excepcionalidade de Mao Tsé-Tung, Zhou Enlai e Deng Xiaoping se explica pela magnificência da História e da cultura chinesas. Por isso, quase metade de “Sobre a China” é dedicada a apresentar essa História e os aspectos singulares da cultura do antigo Império do Meio. Os líderes chineses são herdeiros de um Estado-civilização que produziu um pensador da estatura de Confúcio e que elaborou uma forma própria de lidar com os homens e com as coisas do mundo. Como Kissinger sublinha no prólogo, em qual outro país o governante pode reunir seus generais antes de iniciar a campanha militar e “invocar princípios estratégicos de um episódio ocorrido mais de um milênio antes”, como Mao o fez antes de as tropas chinesas se lançarem contra os indianos em outubro de 1962? Naturalmente, só um país de cultura rica e requintada, que criou seu próprio jogo de intelecto — o wei qi (jogo de peças circulares). Equivalente ao conhecido jogo de xadrez, que objetiva a vitória final mediante o xeque-mate, o wei qi é, diferentemente, um jogo de campanha prolongada que ensina a arte do cerco estratégico, ou seja, a artimanha de tirar o inimigo do combate sem confrontá-lo, apenas levando-o à posição de isolamento.

O encontro de Nixon com Mao em 1972 foi, portanto, a reunião dos representantes de dois países excepcionais que, tal como aquele de Metternich e Castlereagh em Viena, em 1815, determinou mudanças de amplo alcance na estrutura do poder mundial. A China, que havia sido dominada e submetida a toda espécie de humilhações pelos ingleses e pelos demais ocidentais por todo um século, até recuperar a autonomia e a dignidade sob a liderança de Mao e do Partido Comunista, voltava a ocupar o lugar a que estava habituada desde havia muito, aquele de Estado central nas relações internacionais. Segundo Kissinger, destacado ator e cronista do processo político-diplomático que culminou nesse encontro histórico, o diálogo permanente que os novos líderes políticos de Estados Unidos e China têm sabido manter constitui a chave para a paz mundial.

Enfim, o autor, que é capaz de reproduzir diálogos espirituosos — como aqueles com Mao, em que Kissinger se surpreende quando seu interlocutor revela que torcera pela eleição de Nixon, por nutrir simpatias pelos direitistas, ou quando se lembra de sua amizade com Chiang Kai-shek —, já não se mostra muito criativo quando o tema é o futuro. Talvez um tanto inebriado pelo que julga sua grande obra, não leva muito em consideração a grave crise por que passam os Estados Unidos, e continua apostando que o país e a China exercerão a liderança no mundo, à frente de uma Comunidade do Pacífico.

*WILLIAMS GONÇALVES é professor do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais da Uerj